Estratégias ajudam a evitar cliente insatisfeito

26/09/2011 10:09

Ser uma empresa consolidada, há 20 anos no mercado paulista, e contar com Tecnologia de sofisticados equipamentos, cumprindo normas de segurança e higiene, e controlando a qualidade das matérias-primas, não foi suficiente para a Farmácia de Manipulação Fórmula Ativa escapar de uma advertência por parte Procon de São Paulo. Movido por denúncia, o órgão de defesa do consumidor buscou certificar a afirmação de uma cliente da empresa farmacêutica que se julgou lesada pela quantidade de remédios disponibilizados em determinada embalagem que havia encomendado.   

“A consumidora solicitou uma formulação de 30 ml e o colaborador responsável pela manipulação a envasou em embalagem de 60 ml. Quando a cliente recebeu o produto, questionou a quantidade contida, e alegou que o recipiente estava incompleto”, conta a sócia-proprietária da Fórmula Ativa, Simone Diniz. Segundo ela, a consumidora primeiramente fez a reclamação para o farmacêutico da empresa, que, através de rastreamento interno, constatou a utilização da embalagem maior. “A situação foi explicada para a cliente, que não se deu por satisfeita e fez a denúncia no Procon”, lembra Simone, explicando que quando tomou conhecimento do fato, junto com a sócia, tratou de realizar uma Ação corretiva para evitar outros transtornos decorrentes desta circunstância.

A partir do episódio, segundo a empresária, ficou estabelecida uma nova regra através de treinamento dos colaboradores. Na utilização de embalagens não condizentes com a quantidade especificada em receita, é obrigatório identificar através de etiqueta que, apesar de o medicamento ter sido formulado de acordo com a quantidade descrita no receituário, por motivo técnico foi utilizada embalagem com capacidade de armazenar maior quantidade. “A Ação funcionou bem, e atualmente todas as manipulações são identificadas a rigor. O resultado é que não tivemos nenhum outro caso semelhante”, garante a proprietária da farmácia.

Investir em treinamento é uma das iniciativas que mais apresenta resultados quando o assunto é desenvolver qualificações ou assegurar procedimentos que evitem possíveis denúncias, seguidas de processos judiciais ou autuações de órgãos como o Procon. “Se as empresas agirem com bom senso, e de acordo com a lei, certamente minimizarão os danos aos consumidores”, esclarece a advogada Gisele Friso, especialista na área. Ela aponta a cordialidade e o tratamento digno ao cliente como aspectos essenciais. “Estes são valores que já deveriam estar incutidos na filosofia das corporações, e não há dúvida que funcionários necessitam de treinamento constante.”

Com a propriedade de quem tem experiência no assunto, a empresária Simone Diniz acrescenta: “É aconselhável que as empresas façam rastreamento interno com todas as documentações arquivadas, para garantir a qualidade de seu trabalho e conseguir explicar qualquer desvio que possa ser motivo de denúncia.” Ela cita como exemplo os formulários de reclamação, que em geral levam a descrição de situações tratadas com os clientes e a disposição interna da empresa.

Outro ponto são as ações corretivas, em que devem estar listadas as atitudes tomadas para solucionar os problemas, bem como os de ações preventivas, com descrições das iniciativas que possam ajudar a evitar eventuais problemas. “Os comprovantes de treinamentos de colaboradores também devem ser guardados, datados e assinados pelos respectivos responsáveis para assegurar sua autenticidade”, ressalta. “Outra dica é que todos os empresários se coloquem no lugar dos clientes, pois também somos consumidores e almejamos um excelente atendimento.”

Consultoria jurídica pode identificar mudanças necessárias
Para prevenir e até evitar que ocorram advertências ou autuações por parte de órgãos de defesa do consumidor, os aspectos que devem ser levados em consideração pelas empresas passam pelo cumprimento efetivo do que dispõe a legislação voltada ao tema. “O Procon apenas autua empresas que ajam em desacordo com o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e demais leis relacionadas”, destaca a advogada especialista na área Gisele Friso. Ela ressalta que o Investimento em consultoria jurídica é importante para analisar procedimentos e verificar o que pode ser melhorado, para que a empresa não sofra as consequências de uma má atuação.  

“Cada segmento possui regras específicas. As normas para o setor de planos de saúde, por exemplo, diferem das regras estabelecidas para o comércio varejista de roupas. Por isso, é importante que firmas e companhias tenham conhecimento dessas especificidades, para poder se prevenir e agir de acordo com a lei”, esclarece Gisele.

O advogado especialista em direito do consumidor Alexei Marqui concorda. “Para evitar ou mitigar ser responsabilizada pela reparação de danos, é preciso que a empresa se informe, através da orientação de um consultor jurídico. É fundamental ter a ciência do alcance das disposições estabelecidas no CDC, só assim é possível estabelecer procedimentos internos, visando a respeitar a legislação. Também é preciso que uma companhia esteja ciente de seus deveres, caso seja compelida a provar no Judiciário a retidão de suas condutas, no que concerne ao respeito dos direitos básicos dos consumidores.”

Marqui lembra que o CDC distingue dois modelos de responsabilidade por danos: o primeiro é pelo fato do produto e do serviço, ou seja, decorre do dever do fabricante de responder, independentemente da existência de culpa, pelos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos. “Um produto é considerado defeituoso quando não oferecer a segurança que se espera. Uma vez constatado que o dano foi ocasionado em decorrência de defeitos no mesmo, é dever do fabricante indenizar o consumidor, independentemente da verificação de culpa por parte do fornecedor”, explica o advogado.

No caso de responsabilidade por vícios de qualidade ou quantidade, ele aponta que se tratam de casos que tornam o produto ou serviço impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam, ou que exista disparidade quanto às indicações da rotulagem, do recipiente ou de mensagem publicitária. “Nos casos de vícios de qualidade, os fornecedores têm prazo de 30 dias para solucionar o problema - caso contrário, o consumidor pode optar pela devolução do dinheiro ou abatimento proporcional do preço, ou pela troca do produto por outro da mesma espécie.”

Dano moral está entre as reclamações
As ações relacionadas a danos morais que normalmente obtêm êxito no Judiciário estão relacionadas à negativação indevida do nome do consumidor em órgãos de proteção ao crédito e cobrança indevida ou vexatória. Além dessas, há outras mais específicas, caso de ingestão de alimento que contém insetos, extravio de bagagem durante viagem, impossibilidade de utilização de cartão de crédito por problemas com a administradora, apresentação de cheque antes da data acordada e devolução indevida de cheque por parte do banco.

“A questão dos danos morais é muito peculiar, em inúmeras situações podemos identificá-lo, assim como em diversas oportunidades constatamos haver um mero dissabor do consumidor, não necessariamente caracterizando um dano”, explica advogada especialista na área Gisele Friso.

A orientação e informação das empresas e de seus gestores quanto aos aspectos relevantes das leis que disciplinam a relação consumeirista é importante justamente para que não ocorram injustiças. Para isso, já existe estrutura voltada especialmente para atender esta demanda. Criado com este objetivo, o Instituto do Desenvolvimento do Fornecedor (IDF-RS) busca fortalecer a atividade comercial através de assessoria e treinamento aos lojistas e fabricantes.

Entre algumas das ações do IDF, palestras que desvendam o CDC buscam auxiliar empresários na interpretação da lei, orientá-los em como prestar atendimento de acordo com as mesmas, e, assim, colaborara para melhorar a relação com os consumidores. Em Porto Alegre, o Procon também realiza palestras para orientar os fornecedores e lojistas. “Alguns acreditam que estamos ali para fiscalizar através das perguntas que fazemos, e ficam um pouco melindrados na hora de buscar saber o que é certo ou errado. Mas a proposta é, de fato, ajudar a diminuir as autuações”, diz o diretor-executivo do órgão na Capital, Omar Ferri Junior.

Setores de alimentação e finanças são os mais autuados
Em linhas gerais, na área de alimentação os problemas mais comuns que geram autuações dos órgãos de defesa do consumidor são referentes ao prazo de validade dos produtos e diferenças de preços entre gôndolas e caixas registradoras, conforme o diretor-executivo do Procon de Porto Alegre, Omar Ferri Junior. “Estes tipos de autuações são constantes”, frisa, destacando que o órgão realiza fiscalizações permanentes, detectando diversas ocorrências. No caso de bancos e operadoras de telefonias, o Procon também autua bastante, principalmente quando o assunto é cobrança indevida no pagamento de cartões de crédito, sem solicitação do cliente, ou vendas casadas de produtos financeiros, ambas tidas como práticas ilegais. “Também na área de finanças existem muitos problemas com cadastro negativo de consumidores que não devem nada a ninguém”, aponta o diretor do Procon.

“Na área do vestuário, realizamos fiscalizações para conferir preços e verificar a diferença cobrada pelos lojistas entre pagamentos em dinheiro, cheque e cartão de crédito”, diz Ferri Junior, esclarecendo que o valor de uma parcela deve ser o mesmo para todas as formas de cobertura. Ele lembra ainda que outra ocorrência comum acontece no caso de propagandas enganosas. “Recentemente fizemos notificação para grande parte de concessionárias de veículos da Capital, no sentido de atentarem e respeitarem o CDC no que ser refere à publicidade dos produtos”, diz. Segundo ele, é comum a publicação da imagem de um veículo ao lado da indicação do Preço de outro.  

“A propaganda integra o contrato, e não é permitido anunciar o Preço de um veículo de cor branca, ao lado da foto de um automóvel prata, por exemplo. Isso porque a diferença de valor entre ambos é de R$ 1.200,00”, alerta. Ferri Junior garante: se um consumidor se sentir lesado com uma propaganda do gênero - , como no exemplo citado - e quiser entrar em juízo para comprar um carro de cor prata pelo Preço de um de cor branca, caso assim o tenha sido anunciado, certamente terá ganho de causa. “Outro erro de algumas empresas vendedoras de automóveis é não incluir o frete no valor do produto”, destaca, frisando que esta é uma obrigação da concessionária, tendo em vista que a entrega faz parte da compra.

Boas práticas aproximam os consumidores das marcas e lojas
Uma medida muito bem-vista pelo mercado é a determinação de que em cada estabelecimento comercial haja um manual do Código de Defesa do Consumidor à disposição dos vendedores e consumidores. “Isso trouxe redução enorme de ruídos entre ambas as partes”, avalia o diretor de Relações Institucionais da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), Luís Augusto Ildefonso da Silva. Ele garante que a prática de disponibilizar o CDC ao alcance do cliente tem minimizado cada vez mais autuações de Procon junto ao comércio. “Outro ponto positivo é que os órgãos de defesa do consumidor, de uns tempos para cá, têm estabelecido uma relação mais educativa, substituindo a fórmula da punição adotada até pouco tempo atrás.” A Mercopan Pães e Doces, de Porto Alegre, segue à risca a recomendação e tem CDC à disposição dos clientes no balcão.

Silva acredita que a falta de conhecimento da legislação por parte dos compradores é um dos fatores que geram processos contra as empresas. “Se alguém compra um eletroeletrônico com defeito no tempo da garantia, em geral reclama na loja, acreditando que o comerciante é o responsável pelo problema. E como às vezes a indústria, que é a verdadeira responsável, extrapola no prazo da entrega do concerto do aparelho ou de um produto novo, o consumidor abre processo contra o lojista”, explica o dirigente. Ele dá a dica para que isso seja evitado: capacitação, atualização, treinamento e envolvimento dos funcionários atendentes são a fórmula. “Envolver os colaboradores dentro das normas do Procon é a melhor iniciativa”, opina. A advogada Gisele Friso lembra que a legislação em geral visa à proteção do consumidor, que é a parte vulnerável das relações comerciais, mas que é preciso que o mesmo aja de boa-fé, com transparência, e que seja honesto nessa relação.

Entenda a diferença entre autuações e reclamações junto ao Procon
Atuação: É aplicada em vista da atividade fiscalizatória da entidade, como, por exemplo, questões relacionadas a afixação de preços, embalagens e rotulagens, prazos de validade, atendimento preferencial, entre outras.

Reclamação:O Procon pode intermediar as reclamações de consumidores em relação a fornecedores, recebendo a reclamação, encaminhando ao fornecedor e repassando a resposta ao reclamante, incluindo marcação de audiências.

 

 

Fonte: Jornal do Comércio - RS